terça-feira, 18 de junho de 2013

ACOLHER O DIVINO



No melodiar da natureza, Deus nos fala;
em estertores vitais, ele se faz dádiva;
no silêncio do tempo, é oferta.

Deus é acolhido em gestos de respeito;
é bem servido por nossa admiração;
deixa servir-se por encontros fraternos.

Reza insistente o desvaloriza,
pedido repetido o decepciona
e louvação formal o põe em fuga.

Dialogar é abrir-lhe uma porta;
na condição de ‘Outro’, nele cremos;
ao admirar o belo, o acolhemos.

Aprisiona-lo em devoções, é traí-lo;
limita-lo à uma crença, o humilha;
dar-lhe morada fixa é mata-lo.

É na fé solta que ele fica à vontade;
em lidar bem com fatos, é servido
e no imprevisto se faz dádiva.

No pulsar do Universo, ele sorri;
clama em protesto de recém-nascido;
em formas de despedida, é abraço.

Na poesia, Deus é leveza de amor;
na arte, se revela criatividade
e na música, encanto universal.

IMERGIR NO DIVINO



Viver é fazer uma travessia. Ora, o realizo em um lamaceiro, meus pés se tornando pesados, imprimindo cansaço ao andar; ora, ando sobre espuma, e a travessia se torna leve. Acontece também que, não raro, ando em pasto impregnado por água, e lá vou eu me arrastando.

Viver é caminhada. Amarrado a meus problemas, canso.Quando, livre de mim e imerso no ‘divino’, a travessia não pesa.Sereno, usufruo de encantamento em um clima de paz.Posso viver, calculando a distância da travessia. Aí, já no início, sinto o peso da caminhada.

Posso também prender-me, antecipadamente, à chegada,  sentindo-me envolvido por abraços amigos. Na vida, o caminho não é tanto a estrada; é, antes, um estado de espírito.Hei de viver agraciado pelo ‘divino’  - nuvem a me abrigar – que me desprende de mim e me injeta agilidade.

Tocado por divino ‘sopro’ - livre de mim - sinto-me encantado pelo que me cerca e acontece. Por tudo e todos, o ‘divino’ me atrai. Sim, me inspira, me puxa e impele, me levanta quando caio. Nem o favorável nem o desfavorável dão conta de me aprisionar. Nem o triste nem o alegre determinam meu humor;nem o fácil nem o difícil me fazem rir ou chorar.

Parece, não sou daqui nem dali; não me deprimo nem me exalto; não suplico nem insisto, estou identificado com o viver. Sim, assumo o acontecer com seu partir e chegar, seu pedir e agradecer, seu rir e chorar. Mãos divinas me conduzem, a corda da vida se faz solta. O existir me alegra na tristeza, me torna agradecido na perda. Encurto até distâncias, no tempo e no espaço, envolvendo, desde já, o futuro pelo presente.

Não sou nuvem nem sol, mas aparência de leve neblina a deslizar, elegante, na correnteza do ar. É o ‘divino’ que me atrai e empurra, me identifica com diferentes, me iguala a opostos, me integra com os que me cercam. Viver se torna leve e transparente; o caminho se dissolve. Já cheguei, embora ainda distante; já cumpri meu papel, embora ainda no meio do caminho. Estou em paz.