terça-feira, 8 de maio de 2012

DEUS NA EVOLUÇÃO



Houve quem dissesse que, na natureza não há absolutamente nada que reflita algo de Deus. Este, em nada e ninguém, deposita uma prova de sua presença, pois em tudo só existiria uma convulsão fortuita de acasos. Mesmo quando esses se complementam e se aperfeiçoam, sucede somente o que até hoje constatamos: inferiores desaparecem para dar lugar a superiores, sendo que esses se aproveitam dos inferiores mediante a lei do evolucionismo.

Darwin enriqueceu essa visão do evolucionismo com a chamada seleção natural. Conseguiram sobreviver as formas de vida mais bem adaptadas às circunstâncias. O desafio é verificar de onde teria surgido essa adaptação? Seriam influências químicas ou irradiações cósmicas que influenciaram o material herdado – os genes? Caso adequadas, melhoraram, evoluíram; em caso oposto, pereceram. Esta teria sido a ordem natural das coisas.

O processo seria infindo. De um todo mais complexo, teria emergido uma forma nova com propriedades anteriormente inexistentes. E tal processo se teria repetido ao infinito, provocando, a longuíssimo prazo, mutações favoráveis até aquelas que hoje conhecemos. Seriam o resultado de conjuntos de fatores, cada vez maiores e mais complexos, que produziram formas novas, mais perfeitas de seres que foram emergindo desse processo.

Estaria mesmo em jogo o chamado acaso? O sentido desse acaso é este: algo sem prévio direcionamento, algo imprevisível, indeterminável. Enfim, algo além do  necessário e do intencionado; não fruto de simples acaso, uma vez que não poderia ter sido diferente. Razão:  processos físicos, sobretudo em macro-nivel, são inevitáveis por seguirem leis fixas.

A extinção dos dinossauros, há 65 milhões de anos, o comprova. Cientistas afirmam que tanto o tempo como o espaço estavam determinados. Aqui, ‘acaso’ significa simplesmente que, com frequencia, não se pode ter idéia dos fatores infindos a explicar o resultado. Algo assim pode ser a origem do olho humano e a forma e o colorido variados de borboletas e peixes.

Processos naturais não carecem de uma intenção; basta a cadeia de causas naturais. Só por não se enxergar uma real intenção, isso ainda não significa que não existe. Eventuais intenções exteriores não pertencem às leis da mecânica, das ciências exatas, na quais as leis são sempre as mesmas. No caso de algo nos surpreender, podemos até falar do acidental, do fortuito, do ocasional.  Porém, avaliações, subtraídas às ciências exatas, não são objetivamente confirmáveis.

E quando confiadas às mesmas, não são reflexo de uma verdade única e total. Aqui, todo respeito é pouco, toda manipulação é um equívoco. O que há, com frequência, é uma forçada sublimação religiosa ou a simples ignorância. O que temos de evitar a todo preço é recorrer a uma intervenção celeste para explicar realidades terrestres. Afinal, milagre – algo sem causa ou acima e contra as leis é uma contradição, não pode existir, nem Deus o pode realizar. Progressivamente, em um processo evolutivo e tocados pelo ‘divino’, puderam desprender-se, a fim de se tornar pecinhas em um
mosaico universal multicolorido, em um cosmos pluralista encantador. E eis que Deus se foi tornando cada vez mais formoso na Criação que se afirmava em sua dignidade ‘autônoma’ em clima de ‘interconectação cósmica’.

Exemplo. Se eu me desse ao trabalho de colar mil pingos de tinta, de cores variadas, em mil pecinhas de mármore, alguém até poderia enxergar uma obra de arte, a maioria seria da opinião que isso nada tem a ver com um quadro. Pergunto: um biólogo pode achar que a evolução da natureza está destituída de um direcionamento, de um plano? Pode até concluir que há um artista escondido na origem da natureza ou em uma peça musical. Mas nesse caso, ele já não se pronuncia como praticante de ciências exatas. Nada contra.

Afinal, o domínio dessas ciências, por valioso que seja, se limita a um segmento parcial do todo do conhecimento humano. Mais. O ser humano é superior a um cientista e o alcance de seu conhecimento é mais amplo que o das ciências. Ainda bem. A vida seria assustadoramente pobre, caso tivesse de limitar-se a certezas cientificamente verificáveis. O que seríamos sem amor e beleza, sem arte e justiça, sem filosofia e poesia, sem política e religião, sem amizade, sem fé e esperança? Além disso, verdade é um conceito mais rico que exatidão. Verdade implica perspectivas reveladoras e sentenças relativas a níveis mais profundos da realidade. (Claro, tais sentenças jamais podem estar em conflito com certezas provadas no domínio científico, senão a verdade se anularia a si mesma.)

OCASIONALIDADE CEGA OU DIRECIONAMENTO PLANEJADO?

A segunda escolha agrada mais à admiração pela grandeza de tudo que vive e também à própria evolução em seu conjunto. Por outro lado, nega a autonomia inerente ao todo do Cosmos; e, por sua vez, não deixa a teonomia intacta, soberana. Afinal, Deus não merece ser reduzido a um intervencionista.
Melhor é comparar Deus com Mozart, cuja sonata é qual imensa catarata de sons. Estes, tocando nosso ouvido, se transformam em impulsos elétricos a se tornarem uma ondulação, desencadeando uma reação agradável. É como se o espírito do artista se incorporasse na matéria e transbordasse a mesma para envolver os ouvintes extasiados, elevando-os espiritualmente.

Ora, esse espírito expresso e alojado, na matéria, é fator de criação. Assim, até no darwinismo mecanicista faz sentido enxergar a presença, a ação de uma realidade ou dimensão espiritual – em nosso caso, Deus - que, em ricas e variadas formas de matéria e de vida, revela progressivamente sua presença admirável e misteriosa. Isto possibilitou que da não-vida viesse a surgir, um dia, a vida e do inconsciente a consciência reflexiva.

Abrigados em Deus - depois da irrupção original - vida e consciência, amor e beleza já se encontravam embrionárias na matéria, na energia ainda em suas formas não vivas. Progressivamente, em um processo evolutivo, e tocados por esse divino, puderam desprender-se a fim de se tornar pecinhas em um mosaico universal multicolorido, em um cosmos pluralista encantador.

E eis que Deus se vai tornando cada vez mais formoso em sua criação e esta, altaneira, se vai afirmando em sua dignidade autônoma em clima de interconectação cósmica.