quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

A ARTE DE VIVER

Há os que reduzem essa arte ao hedonismo – felicidade subjetiva consumista. De fato, supõe-se acesso ao alimento, à água, saúde, educação, salário, lazer, etc. Mas isso ainda não garante a felicidade. Há tantos que, sendo privados de algo essencial, ainda se julgam felizes. Para Aristóteles, tudo tende à sua própria perfeição. Alcançar esse objetivo teria a ver com virtude que - êxito nas iniciativas – resulta na felicidade. É o que pode suceder com um casal, um professor, um lavrador, um mecânico, um empresário, um médico, um administrador, um político, um líder, etc. Felicidade, portanto, não se reduz a um bem-estar subjetivo, mas implica o sucesso em nossos empreendimentos. Assim, a felicidade de um colecionador implica seu esforço de coletar. Isto é bem mais que o simples receber de algo já feito - pronto, completo - sem que tenha custado algum esforço.

A arte de viver implica deixar conduzir-se pelo objetivo intrínseco de suas atividades, o que supera algo extrínseco como dinheiro, prestígio e poder, (não raro vantagens de carreirista). Pessoas internamente motivadas merecem o respeito de todos. Parecem felizes e irradiam impulsos positivos em seu meio. Virtude é desenvolver as próprias potencialidades, o que é o primeiro dever para consigo. Aristóteles, em uma perspectiva elitista, julgava que condições indispensáveis - além do esforço pessoal – eram: muito tempo livre e um bom número de escravos. À potencialidade existente hão de corresponder condições favoráveis, sobretudo em casos de pessoas excepcionais. Nesse caso, cresce a responsabilidade do poder público quanto ao trabalho, alimentação, saúde, transporte, educação e lazer. A partir disso, as pessoas poderão tomar rumo.

Uma vida com êxito não depende só do esforço das pessoas e de suas escolhas. Entre o fator sorte – eudaimônia = circunstância favorável. Quanto a isso, encontramo-nos em situações bem melhores do que séculos e décadas passados. Hoje – ainda para uma17 minoria - quase tudo se encontra sob nosso comando, graças à ciência e tecnologia. Entram também em jogo as ‘ocasionalidades” – certos acasos (des’ -)favoráveis – fora de nosso controle como também vulnerabilidade, envelhecimento, enfermidade e mortalidade. Grave ilusão é querer transformar o mundo em um parque global de diversão como se tivéssemos o dever de ser felizes só no cultivo do prazer.

Ignorar a limitação humana é negar nossa condição de simples mortais. Também a morte (M. Heidegger- sein zum Tode) tem um aspecto positivo. Por mais que doença, velhice e morte sejam uma ruptura, são também o horizonte inevitável que torna a vida significativa. Luis Borges o ilustrou pelo conto “O Imortal”, mostrando que a morte enriquece o viver com desafios, fazendo superar indiferença, letargia, imobilidade. Vida é mais que sobre-vida, pois o que dá sentido ao viver é seu objetivo. Vida de qualidade vale mais que vida longa esvaziada. Carecemos de projetar nossa vida para além do horizonte atual. Não nos contentamos com nosso limitado existir; buscamos algo que nos transcenda. O direcionamento para algo diferente – um fim superior a nós - dá sentido ao viver. Todos vivemos em vista de algo fora e além de nós – ideal - como a pessoa amada, filhos, trabalho, empresa, sociedade, ciência, filosofia, espiritualidade.

O risco que nos acompanha é a perda. Basta lembrar de adeptos de uma ideologia que não se realiza, de um amor que fracassa, de um Deus que não existe, de uma religião que não corresponde. Certo, quem não se engaja, não corre risco, não se (des-)ilude, porém leva uma vida vazia, sem ideal, desinteressante, enjoada. O estoicismo é uma alternativa, porém, enquanto preserva de perdas, não preenche o vazio. Vida sem risco é vida sem valor. Ninguém imuniza sua felicidade contra azar ou destino. Basta viver bem e, mesmo em adversidades, ter um pouco de sorte, a fim de que vida não pese demais e até adquira um sentido, embora exija um preço. Aqui, a alegria é uma oferta gratuita; ela nos pode surpreender, mesmo que não a tivéssemos em vista. Viver vale a pena. Quase sempre.
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COMO ACOLHER DEUS?

Corre risco quem acolhe o Deus de certos catecismos e sermões apologéticos; é qual Deus todo-poderoso, afeito a cobranças e ameaças de castigo para suas criaturas. Simplesmente negar Deus? Pelo contrário, mais que nunca autenticar o conceito ‘Deus’. Nosso objetivo seja, portanto, ‘salvar Deus’ - de maus tratos e preconceitos.

Com respeito e admiração imagino o ‘Deus em mim’, à maneira como um filho imagina e adora sua mãe, sempre disponível, à qual deve tudo: vida, bons cuidados, solidariedade e bem-estar. Como Deus, também a mãe está aninhada no coração do filho e, por ele, se alegre, sem mendigar sua gratidão. Amor em total liberdade.

Eis o que, para mim, o ‘indeterminado Deus’ representa. Mesmo em tom jocoso, porém com seriedade, eu diria que ele nem faz questão de ser ‘Deus’ e muito menos imagina o tanto que lhe devemos. De fato, ser Deus implica esquecer-se de si na dedicação a todos. Reconheço-me um apaixonado por esta fé e, como Jonas, lá vou eu pregando.

Sei-me gerado, tocado, impregnado por Deus. Porém, é o Deus escondido em Jesus, com suas Bem-Aventuranças. Sim, seu Deus é quem se afirma na alegria e no protesto, se faz dádiva em sua fragilidade, é amigo em serviço, presença na ausência, enquanto se revela, na vida mais sofrida, sorriso que humaniza por fiel doação.


NESSE DEUS CONVÉM CRER E A ELE SERVIR!
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